Solo la luna comprenderá, da diretora costarriquenha Kim Torres, se destaca por seu habilidoso entrelaçamento de diferentes temporalidades, elaborando, pelos elementos narrativos e estilísticos, uma tessitura da memória, atualizando as noções de mise-en-scène como revelação do enigma e do mistério. Partindo da impossibilidade de narrar momentos fugidios e de grande intensidade, o filme se desenvolve em tom de fabulação, apostando nas lacunas e nas incompletudes, nos vestígios de uma quase história: nos recortes e janelas, nas dinâmicas entre luzes e sombras que preenchem os planos como em um jogo de esconder e mostrar, enfatizando uma relação temporal dada pela natureza da brincadeira, com intenção e pulsão de vida, colhendo detalhes insignificantes do cotidiano e da marca do sobrenatural, daquilo que é, ao mesmo tempo, eterno e muda a todo instante.
Pelos relatos imprecisos e olhares imaginativos das crianças – permeados pela vontade de ir embora e encarar todo o sentimento do mundo, convivendo com o desejo de permanecer indefinidamente instalado em um passado de afetos –, o filme elabora uma imagem do que pode ser crescer em Manzanillo, na Costa Rica. A obra interpela as brincadeiras na praia, as andanças sem fim pelos cantos do vilarejo que a câmera acompanha, participante, subjetiva, imprecisa, a intensidade de um instante que apenas a lua pode testemunhar em sua plenitude. Flertando com o experimental, Solo la luna comprenderá se desocupa das estruturas narrativas para oferecer ao espectador uma rica e transcendente experiência de cinema.
Alessandra Brito, Gilson Plano, Pedro Vaz Peres