Em cerimônia realizada no Cine Humberto Mauro, o 27º FestCurtasBH anuncia os filmes premiados nas mostras competitivas Internacional, Minas e Brasil, escolhidos pelo júri oficial e o melhor filme escolhido pelo público, no tradicional Júri Popular. O Troféu Capivara também é entregue no inédito Prêmio José Zuba Júnior, criado para homenagear trabalhadores do cinema que contribuem para a vitalidade estética, política e social do curta-metragem.
Na sessão de abertura do 27º FestCurtasBH, os filmes silenciosos de Narcisa Hirsch, a realizadora experimental argentina homenageada nesta edição, incitaram no público um pacto igualmente silente: mais de uma centena de corpos prenderam o ar, suspenderam respiro e abafaram ruídos, um gesto comum e síncrono de amor e respeito ao cinema. O festival conjurou sua primeira e maior magia: eletrizar sensibilidades e forjar um campo múltiplo de partilha. Na premiação do festival, celebra-se os filmes destacados pelos diversos júris e essas vibrações que aconteceram ao longo de dez dias de programação.
O júri da Mostra Competitiva Internacional, composto por Ana Carolina Soares, Flaviana Lasan e Mariah Soares, premiou o curta Sonhos como barcos de papel (Des rêves en bateaux papiers), de Samuel Suffren (Haiti), enaltecendo os “riscos na determinação de um cinema territorializado”. Nas palavras do trio, o diretor haitiano consegue expressar “uma fração de uma nação violentada pela colonização que, mesmo sendo a primeira independente do mundo, a partir da revolta negra, segue repercutindo a consequência dessa violência. Através do drama de um núcleo familiar, que subverte as normas de gênero, somos inseridas em uma narrativa marcada pela emigração forçada”. Para o júri, no “preto e branco – a origem do cinema – se constrói um aprimoramento da linguagem audiovisual em seu ápice tecnológico, na forte carga estética e narrativa, sofisticada mesmo na ruína.”
Uma menção honrosa foi concedida ao iraniano As flores noturnas de Daria ( گلهای شب ِدریا), de Maryam Tafakory, uma cineasta que “insurge de forma corajosa e alquímica”, cujo filme “reacende — e arde como o fogo — toda a opressão e o silenciamento impostos às mulheres. A força de sua expressividade, manifestada em textos, desenhos, cores e montagens, transforma-se em um ato de vingança simbólica que, para nós, soa como um despertar”.
Na Mostra Competitiva Brasileira, o afeto e a afetação de Leona Vingativa, Aria Nunes, Laiana do Socorro, Victor Henrique Oliver, Agarb Braga, Mac Silva e Juan Moraes cativaram o júri formado por Bramma Bremmer, Fernanda Pessoa e Rubens Fabrício Anzolin. Eles destacaram a “descentralização regional, de classe e a inventividade formal” do paraense Americana, dirigido por Agarb Braga, uma encarnação já incontornável do deboche transformador do cinema queer. Em uma chave e cadência bastante distinta, que reitera a versatilidade do cinema nacional, o júri conferiu Menção Honrosa a Cartas do Absurdo, do Rio de Janeiro. Para eles, o trabalho de Gabraz “aposta na sustentação de duração e no encanto entre montagem, palavra e superfície”.
Na Mostra Competitiva Minas, o júri constituído por Ana Júlia Silvino, Anna Flávia Dias Salles e Marcos Donizetti laureou o belo-horizontino Núbia, de Bárbara Bello, “por sua coragem estética, pela consistência de sua proposta formal e pelo modo singular como habita o espaço erótico-urbano”. Princesa Macula e o Canto Triste, de Mayara Mascarenhas, de São João del Rei, recebeu a menção honrosa por habitar “o entre-lugar do sonho e da memória, num gesto de canto e encantamento. O real, com seus tempos e seus corpos, pulsa em liberdade, reinventado na ficção”.
Além do Troféu Capivara, os filmes premiados nas mostras competitivas recebem o prêmio de cinco mil reais.
Todos os filmes que foram exibidos nas mostras competitivas e paralelas concorreram ainda ao prêmio do Júri Popular, que é definido a partir dos votos do público presente nas sessões do Festival. No 27º FestCurtasBH os espectadores premiaram o curta-metragem “Tita: 100 Anos de Luta e Fé”, dirigido por Danilo Candombe. O filme é uma celebração ao legado de Maria Gregório Ventura, a Dona Tita, matriarca do quilombo Morro Santo Antônio, em Itabira. Aos 100 anos, ela compartilha os saberes e memórias de uma vida ancestral” (Gabriel Araújo, membro da comissão de seleção do Festival). Além do Troféu Capivara, o premiado recebe um prêmio de três mil reais.
A cerimônia foi marcada, ainda, pela criação e entrega do Prêmio José Zuba Júnior, em homenagem ao criador do festival, um amante do cinema que que nos presenteou com este espaço de partilha e encontro com o cinema de curta-metragem há mais de três décadas atrás. O prêmio é concedido pela organização do Festival a artistas, coletivos e trabalhadores do cinema em várias frentes como a crítica, pesquisa, produção, curadoria que se destacam ao contribuir para a vitalidade estética, política e social do cinema de curta-metragem.
Reconhecendo os seus impactos na educação pública por meio da produção curta-metragista, o FestCurtasBH concedeu o prêmio ao projeto “Luz Câmera, Escola em Ação”, desenvolvido na Escola Municipal Newton Amaral Franco, em Contagem, sob coordenação da professora Sheila Rodrigues. Criado em 2017, o projeto, que aposta na vocação educativa do cinema, envolve estudantes de todas as idades na criação de roteiros, na gravação e na finalização de filmes que abordam temas sociais como preconceito, racismo, meio ambiente e amizade. O projeto, que já circulou para 57 festivais nacionais e internacionais, participou novamente do FestCurtasBH, neste ano, com os curtas O gato e A natureza, que encantaram programas voltados para o público infantil.
Por fim, o encerramento do FestCurtas soprou seus feitiços em honra à realizadora mexicana Azucena Losana, homenageada na edição anterior, com a exibição dos seus filmes Pantano (2019) Warmi Danzaq (2025).
A sessão dos premiados acontece no domingo (9/11), às 20h, encerrando uma jornada extensa e intensa. O FestCurtasBH consolida-se, a cada ano, como um espaço incendiário e visceral que acolhe, com poesia e criticidade, a maleabilidade estética e a radicalidade política do curta-metragem. Até a próxima, pessoal!